segunda-feira, 16 de maio de 2011

Três Continentes e Uma Uva com vários nomes

Croácia - Dalmácia
Como na maioria dos países da Europa Central, o cultivo da uva remonta a colonização helênica e os séculos de domínio romano. Na Croácia não foi diferente. Os vinhedos e a viticultura sobreviveram às invasões bárbaras e a proibição do consumo de bebidas alcoólicas impostas pelo Império Otomano. Neste cenário de constantes mudanças político religiosas, a cultura da vinha e do vinho sobreviveu não apenas pela presença de uvas autóctones, mas também pela resistência silenciosa de rebeldes produtores croatas. Vale destacar que os barris de carvalho eslovenos eram usados no envelhecimento dos mais renomados vinhos italianos.
Cepa quase esquecida, a Crljenak Kastelanski, que significa uva tinta de Kastela em tradução livre, produz frutos de bagos graúdos, casca fina e alto teor de açúcar. O resultado são vinhos encorpados de alto teor alcoólico que muitas vezes rompe a casa dos 15%, sem passar por processo algum de fortificação. Infelizmente, sem importador para vinhos dessa origem, ainda não há exemplares dessa cepa no Brasil, uma vez que a Croácia está reconquistando seu espaço no mundo vinícola após o esfacelamento da Iugoslávia e a Guerra dos Bálcãs.
Itália - Puglia
Na Itália, mais precisamente no salto da bota, a Puglia conta com 110 mil hectares de vinhedos de Negroamaro, Fiano e Malvasia. Mas a grande estrela da região é mesmo a Primitivo. Por muito tempo foi considera uma cepa inferior, usada em pequenos lotes para elaborar alguns Amarones. Muitas vezes é vendida para produtores da Toscana e Piemonte para compor vinhos dessas regiões.
Esta cepa foi introduzida na região por volta de 1870 pelos monges beneditinos. Em 1881 chegou à sub-região da Mandúria, onde encontrou as condições ideais de terroir. Atualmente, conta com a D.O.C. Primitivo de Mandúria. Para garantir a estampa de DOC na garrafa, o vinho produzido deve ter mínimo de 14% de álcool entre outras especificações. No geral, são vinhos muito ricos e cheios de fruta madura que harmonizam muito bem com massas e pratos de sabores marcantes.
EUA - Califórnia
Após anos de mistérios sobre sua origem, uma pesquisa feita pela Universidade de Davis em 1990 concluiu que a Zinfandel tem base genética semelhante à Crljanak e a Primitivo.
As primeiras mudas chegaram aos EUA em 1820, e conta com uma controvérsia a cerca de quem teria sido o pioneiro introdutor da cepa em terras yankees. A primeira versão volta ao mesmo ano de 1820, quando o então enfermeiro George Gibbs chegou à Nova York com uma coleção botânica de mudas do extinto Império Austríaco. Duas décadas depois se tornou a uva de mesa mais popular no nordeste americano. Com base numa disputa comercial, uma segunda versão sustenta que Agoston Harazsthy foi o introdutor da Zinfandel na Califórnia. Porém, alguns arquivos históricos apontam que o também enfermeiro Frederick Maconday plantou as primeiras mudas na região em 1845. Uma última e talvez mais acertada versão atribuiu o mérito das primeiras mudas de Primitivo aos imigrantes italianos. A uva de Primitivo mais tarde recebeu o nome de Zinfandel.
Tão versátil quanto uma Chardonnay ou uma Cabernet Sauvignon, produz vinhos de diferentes etilos como brancos e roses leves e adocicados. Entretanto, vale lembrar que se trata de uma cepa tinta, que nos EUA adquiriu características singulares como a Malbec argentina e a Carmenere chilena. Pode resultar em vinhos tintos leves e delicados no estilo Beaujalois, como também pode produzir um complexo e longevo Cabernet Sauvignon de Bordeaux.
Atualmente, enfrenta uma crise junto a muitos produtores que tem apostado na substituição dos vinhedos e implantado novas varietais como: Cabernet Sauvignon em Napa, Pinot Noir em Russian Valley e Syrah em Paso. Tudo porque a Zinfandel é uma uva muito temperamental: tem grande rendimento por planta o que desfavorece a concentração na fruta, e os bagos do mesmo cacho amadurecem de forma irregular. Todos esses fatores exigem cuidados redobrados na colheita e na seleção que devem ser feitas de forma artesanal. Num país em que alguns exemplares de Cabernet Sauvignon ou Pinot Noir chegam a custar o triplo de um Zin, vem à tona uma questão: Por que produzir um vinho que remunera pouco e exige tanta labuta do produtor? Felizmente, alguns enólogos e vinhateiros tem ignorado essa questão e tem se mantido fiéis a Zinfandel. Seghesio, Coppola e De Loach são alguns e com certeza se manterão na ativa por muitos anos.
Chile – Maipo
Em 1986, Don José Canepa filho do fundador da Vinícola Canepa, junto com suas três irmãs Gilda, Edda e Antonieta introduziram mudas de Zinfandel californianas no Vale de Maipo. Após a morte de Don José a Zin ficou em segundo plano, ressurgindo em 1997 depois da unificação das propriedades da família Canepa sob o nome de Terramater e Millaman.
Como na Califórnia, a região do Maipo foi à região onde a Zinfandel conseguiu atingir excelentes resultados, mesmo sendo uma cepa temperamental. Os mostos originários desse terroir são de personalidade única: intensos e concentrados com notas marcantes de ameixa seca, figos e chocolate. Outras regiões vem trabalhando com a uva, mas os vinhos obtidos tem sido inexpressivos.
Independente do nome, origem e estilo de vinho é uma planta que desafia o vinhateiro durante o ano todo e especialmente na colheita. Mas o desafio maior está na vinificação e elaboração do vinho que chegará ao consumidor. Parece que cada bago, cada gota de mosto, interpela o enólogo dizendo: 'faça algo de mim se puder'.

2 comentários:

Anônimo disse...

muito didatico parabens

Anônimo disse...

Boa dica